Percebemos, de antemão, a
diferença entre direito e moral, conceitual e comparativo estudo do dever-ser
jurídico com relação ao dever-ser moral. Há que se deter na análise, buscar
semelhanças e diferenças. De princípio abordar-se-á a unilateralidade, a
incoercibilidade e autonomia do Direito, e as notas essenciais da moral.
Inquirimos a respeito de fatos: Como trabalhar com penas para o incesto (que
não é considerado crime no sistema jurídico repressivo brasileiro), a dívida do
jogo (descrita no art. 814 do Novo
Código Civil), a preocupação constitucional com o princípio da moralidade
pública, expressa no art. 37, caput: “A administração pública direta e
indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência...”. Aqui se comprova a relevância do princípio moral para a própria
organização, manutenção e credibilidade cívica dos serviços públicos. O que é
moralmente recomendável tornou-se
juridicamente exigível do
funcionalismo público. Como balizar a teoria do negócio jurídico e dos tratos
comerciais em torno da ideia da boa-fé, estabelecendo inúmeras presunções a ela
concernentes (art. 164 do novo CC). Como lidar com os maus tratos e violações
dos direitos humanos das crianças? (art. 1.638 do novo CC). Em muitos casos,
fica o juiz autorizado, jurídica e formalmente, em caso de lacuna da lei, a
aplicar os costumes como forma de solução de litígios (art. 4°da LICC).
Por estas e outras razões, até mesmo do ponto
de vista histórico, podese provar a intrínseca relação do direito com a moral.
Isso porque, a princípio, eram indistintas nas comunidades primitivas as
práticas jurídicas, as práticas religiosas e as práticas morais. A sacralidade,
o espiritualismo e o ritualismo das antigas práticas jurídicas e de suas
fórmulas denunciam essa intrínseca relação 20 . As perguntas que nos vêem à
mente se baseiam na relação entre direito e moral, nos principais aspectos
normativos que caracterizam cada qual dos ramos normativos e; se o direito se
alimenta da moral, convive com ela, e lhe envia novos conceitos e normas.
5. Conclusões
Ao fundamentar nossas assertivas no parâmetro
da ética, moral e direito, podemos concluir afirmando que o direito sem moral,
ou direito contrário às aspirações morais de uma comunidade, é puro arbítrio, e
não direito 21 . Hans Kelsen critica as teorias que procuram a distinção do direito com relação à moral a partir dos
critérios interioridade (moral) e
exterioridade (direito). A crítica de Kelsen repousa, sobretudo no fato de que
o direito por vezes regula condutas internas e por vezes regula condutas
externas, assim como ocorre com a moral. Esse critério seria, portanto,
insuficiente para dar conta do problema. Se o direito for entendido e definido
exclusivamente a partir das ideias da normatividade e validade, então seu campo
nada tem que ver com a ética. Esta é a proposta de cisão metodológica, que
acabou por provocar fissura profunda no entendimento e no raciocínio dos
juristas do século XX, de Hans Kelsen. Sintetizando: as normas jurídicas são
estudadas pela ciência do direito; as normas morais são objeto da ética
como ciência. O raciocínio jurídico,
então, não deverá versar sobre o que é certo ou errado, sobre o que é virtuoso
ou vicioso, sobre o que é bom ou mau, mas sim sobre o lícito ou ilícito, sobre
o legal (constitucional) ou ilegal (inconstitucional), sobre o válido e o inválido.
Kelsen argumenta que um direito positivo sempre pode contrariar algum
mandamento de justiça, e nem por
isso deixa de ser válido 22 . Então, o direito positivo é o direito posto
(positum – posto e positivo) pela autoridade do legislador, dotado de validade,
por obedecer a condições formais para tanto, pertencente a um determinado
sistema jurídico. O direito não precisa respeitar um mínimo moral para ser
definido e aceito como tal, pois a natureza do direito, para ser garantida em
sua construção, não requer nada além do valor jurídico 23 . Então, direito e
moral se separam. A exigência de uma separação entre Direito e Moral, Direito e
Justiça, significa que a validade de uma ordem jurídica é independente desta
Moral Absoluta, única válida, da Moral por excelência, do ponto de vista de
Kelsen 24 . Assim, é válida a ordem jurídica ainda que contrarie os alicerces
morais. Discutir sobre justiça, para Kelsen, é tarefa da ética, ciência que se
incumbe de estudar não normas jurídicas, mas sim normas morais e, portanto,
incumbida da missão de detectar o certo e o errado, o justo e o
injusto.Trabalha-se, atualmente, com a ética do plural, através da diversidade,
impedindo a formação de extremos e a exclusão de outras éticas por sistemas
éticos contextualmente predominantes. Dessa forma é que onde está a ética deve
estar o pluralismo e a tolerância; isto é o minimamente ético. O
desenvolvimento lógico-conceitual e pragmático no sentido do alcance da
felicidade, do que seja o “melhor”, do que seja o verdadeiro bem humano são
desdobramentos desse mínimo ético. Assim, deve-se admitir que a felicidade é
impossível se rompidos esses limites. Uma vez que desejamos ver a ética
funcionando, passamos a experimentar a tolerância da diversidade. Em suma, o
amor de uns para os outros, com justiça plena para todos. Quer como ciência
social e política, quer como experiência, quer em sua aplicação através do
processo judicial, como, dentre outros, o Direito reflete o estágio histórico
vivido pela sociedade. Precisamos compreender o Direito não apenas como fato do
homem, mas sim como fato social, que torna possível a coexistência humana.
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