Cabe ao processo servir ao direito
material, não podendo ser deturpado em barreiras ou obstáculos à pronta e
completa aplicação do direito material.
De há muito, especificamente após a
célebre polêmica travada na Alemanha do século XIX, mais precisamente na década
de 1850, entre Bernhard Windscheid [01] e Teodor Muther, seguida da valiosa
obra do jurista alemão Oskar Von Bülow, publicada inicialmente em 1868, o
direito processual firmou-se como ciência autônoma, não mais se justificando o
entrelace entre direito material e direito processual.
Aliás, remonta a essa época a
apreensão dos processualistas em tornar o processo mais célere até a oferta da
tutela jurisdicional, garantindo a efetividade plena do direito material,
instrumentalizando as crises nesses ocorridas por obra dos órgãos
jurisdicionais.
O presente trabalho tem por escopo
demonstrar a coexistência do direito material e do direito processual, como
ciências autônomas e, simultaneamente, interdependentes.
Urge afirmar que, conquanto o
direito processual já tenha, a duras penas, conquistado sua autonomia
cientifica, ainda podemos encontrar – e com maior frequência do que
imaginávamos – resquícios de uma fase sincrética, onde direito material e
direito processual se embaralhavam de forma indesejável.
Insta aduzir que não negamos a
necessidade de se estudar e de se revisitar o direito processual à luz do
direito material [02], haja vista ser aquele instrumento indispensável desse.
Contudo, o que buscamos, é identificar as situações em que, por falta de
perfeita distinção entre direito e processo, há nítido prejuízo à perfeita
oferta da tutela jurisdicional, ora pela morosidade, ora pelo próprio resultado
claudicante, ambos advindos de uma deficiente visão do binômio direito material
e direito processual.
Adiantando os resultados,
concluímos ser premissa básica para os operadores do direito e para todos
aqueles que funcionam ou influenciam diretamente ou indiretamente na prestação
jurisdicional, uma perfeita distinção entre direito e processo, nunca negando
que um somente existe para dar efetividade ao outro, que dele depende para ser
efetivo.
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histórico do direito processual se faz necessário já no limiar desse estudo,
inclusive para que se chegue a compreender com clareza a distinção entre
direito material e direito processual.
Portanto, encetamos, como não
poderia ser dessemelhante, esse trabalho com um breve esboço histórico da
evolução metodológica do direito processual, indispensável para a perfeita
compreensão da problemática enfrentada, iniciando pela fase do sincretismo, em
que esse se fundia com o próprio direito material, até os dias atuais, em que
estaríamos presenciando uma nova fase, pós-instrumentalista, mais preocupada
com a tutela jurisdicional efetiva.
Posteriormente, dentre um emaranhado
de situações em que a prestação jurisdicional é, muito das vezes,
deficientemente prestada pela claudicante visão da distinção entre direito
material e direito processual, pinçamos três que merecerão análise no presente
feito, que são a extinção do processo sem julgamento do mérito por carência de
ação, oportunidade em que defendemos a teoria da asserção, a errônea forma de
julgamento nos tribunais e, por fim, o não conhecimento dos Recursos
Extraordinários lato sensu por questões de mérito.
Por fim, traçamos as
conclusões advindas do presente estudo e traçamos breves considerações
importantes para a solução da problemática enfrentada.
Metodologia
utilizada
O direito material e o direito
processual são tratados pelos legisladores dos diversos Estados visando criar
as regras necessárias para assegurar a pacifica convivência das pessoas e
assegurar a paz e a harmonia na sociedade, objetivo maior do direito e da
atividade jurisdicional.
Assim, o legislador cria e altera o
direito posto conforme as necessidades momentâneas, visando sempre satisfazer
os anseios da opção política adotada pelos destinatários da norma material e da
norma processual.
Justamente por isso, optamos
examinar o tema direito e processo sob o enfoque do direito positivo vigente em
nosso Estado e focando em problemas concretos que clamam por soluções.
Na elaboração do presente estudo
utilizamos a análise da legislação material e processual em vigor; o estudo da
doutrina existente e o exame de casos concretos, consubstanciados na
jurisprudência dos tribunais e, algumas vezes, na análise específica de alguns
processos isolados, o que tentamos evitar, haja vista a dificuldade de consulta
pelos leitores.
Por fim, as conclusões expendidas
em todo o corpo do trabalho estão sistematizadas no último dos capítulos.
FASES METODOLÓGICAS DO DIREITO PROCESSUAL
Como toda ciência [03], a
processual como hodienarmente a entendemos é fruto de constante e lenta
evolução doutrinária. Nenhuma ciência é arquitetada per saltum, e é salutar e
desejável que assim o seja, uma vez que a ciência convive precisamente no
desígnio próprio de sua atuação, ou seja, na perene explicação evolutiva dos
diversos fenômenos naturais e, no caso das ciências jurídicas, sociais.
Conquanto presentemente são
raríssimos os doutrinadores que negam a autonomia científica do direito
processual, não se pode olvidar que o próprio Direito não era reconhecido como
efetivo ramo científico autônomo por parcela expressiva de pensadores há não
muito tempo [04], evoluindo vagarosamente, já tendo sido considerado mero
objeto de uma ciência até que, recentemente, poucos são os que ousam afasta-lo
terminantemente do status de ciência autônoma, status esse consolidado com o
advento da notável obra Teoria Pura do Direito [05], do austríaco Hans Kelsen.
A saudável e necessária ambição de
saber própria do homem fez aumentar sobremaneira o volume do conhecimento
acumulado, tanto que este supera em muito o saber particular de cada indivíduo,
tornando necessária a criação de sistemas de ordenação e classificação
metodológicas visando preservar e permitir a perpetuação desse conhecimento,
que não pode perecer com o individuo. As ciências pertencem à humanidade e não
aos indivíduos que incessantemente a arquitetam, geração após geração.
O próprio conceito de ciência e sua
evolução histórica trazem a necessidade de estipular a área de conhecimento que
compete a cada disciplina científica. Criou-se assim a necessidade de se
determinar e sistematizar o objeto de cada área do conhecimento científico.
Aristóteles formulou uma primeira
classificação que distinguia três grupos: o das ciências teóricas (física,
matemática e metafísica), o das ciências práticas (lógica e moral) e o das
ciências produtivas (arte e técnica).
Embora se haja mantido a
pluralidade de critérios no que se refere à ordenação científica, a tendência
contemporânea é definir várias áreas de conhecimento e englobar em cada uma
delas múltiplas disciplinas.
O conjunto das ciências exatas
agrupa a matemática, a física e a química. As ciências biológicas ocupam-se do
estudo dos seres vivos em diversos níveis. Uma terceira área de conhecimento
agrupa as ciências geológicas e geográficas, que tratam dos fenômenos relativos
à Terra, e as astronômicas, relacionadas ao cosmos. Em outra esfera situam-se
as ciências médicas, também muito diferenciadas, e, por fim, um quinto segmento
engloba as ciências sociais, das quais uma seria justamente o Direito, junto
com a economia, sociologia, dentre outras.
Não delongando em questões
epistemológicas e aceitando a premissa pacífica de que o Direito é efetivamente
uma ciência, cumpre-nos estudar, focando o objeto do presente trabalho, o ramo
dessa ciência denominada de Direito Processual, iniciando com breves linhas
sobre sua evolução histórica metodológica.
Sincretismo
Ubi homo ibi Jus. Desde os
primórdios da civilização sempre existiram regras permeando as relações
sociais, disciplinando a vida das pessoas na sociedade e atribuindo bens.
Enquanto alguns dos destinatários se submetiam integralmente e espontaneamente
a tais regras de conduta, sempre existiram outros que, em determinadas
situações fáticas, relutavam em acatá-las dessa forma (uma vez que os conflitos
individuais e coletivos são inevitáveis, por razões diversas que fogem ao
objetivo desse estudo).
Em havendo desobediência a uma
regra posta, surgia a necessidade de obrigar o destinatário a observá-la
coercitivamente. Nessa fase inicial, acreditava-se que o próprio direito
transgredido dava à luz o direito de ação, permitindo ao titular do direito
acionar o órgão competente para que esse atuasse a norma desacatada. Dizia-se
que o processo era o Direito armado para a guerra. Nesse contexto, a ação
decorria diretamente da regra de direito violado, não havendo nenhuma distinção
entre direito material e direito processual. Sequer se cogitava da existência
de uma distinta relação entres as partes do processo e as partes do negócio
jurídico. O próprio direito infringido adquiria forças para impor sua
observância coercitiva através da mera seqüência de atos desenvolvida pelo
Estado voltadas à tanto.
Fala-se então na fase de
sincretismo, onde o processo não era considerado de forma independente e, sim,
como um mero aspecto do direito material. Negava-se a disciplina e o estudo do
processo e da relação processual entre os sujeitos. Estudavam-se e
classificavam-se apenas os procedimentos, esses entendidos como mera
exteriorização do modo de defesa do direito consistente numa sucessão lógica de
atos desenvolvidos pelo Estado. Nessa fase – sincrética – o direito de ação
decorria diretamente da violação do direito. A cada direito material violado
corresponderia, diretamente, uma ação dele decorrente e apta para resguardá-lo.
[06] Não provada a violação, inexistia o direito de ação.
No sistema do Direito Romano, por
exemplo, no qual reinava absoluto o sincretismo, não se diziam os romanos
titulares de um direito, e sim titulares "de uma ação". Insta frisar
que somente era titular dessa ação aquele que lograsse êxito em demonstrar,
dentro das regras procedimentais de então, a existência do direito material.
Sem esse, não se tinha "a ação". [07] Por sua vez, ser titular do
direito de ação implicava em necessariamente ser titular do direito material.
Essa foi a longa fase do sincretismo, que imperou absoluta desde as origens do
direito até meados do século passado, quando, na Alemanha, começou-se a
especular a natureza jurídica do processo e da ação.
Autonomismo
Como já frisamos, a ciência não é
construída aos saltos: vai se firmando e consolidando pouco a pouco, com a
colaboração de inúmeros cientistas e estudiosos. Assim, sempre é injusto
atribuir a alguém a exclusividade doutrinária científica, uma vez que a ciência
sempre é obra coletiva, nunca individual.
Conquanto obra coletiva, algumas
teses se destacam como verdadeiros "divisores de águas", dada a
importância e a forma como conseguiram consolidar, sistematizar e aprimorar
cientificamente o já construído por outros até então, sendo considerados
verdadeiros marcos na evolução (e, por vezes, na revolução) científica da
humanidade.
O progresso científico decorre não
só de isoladas descobertas importantes, mas principalmente do esforço
sistemático e coletivo para interpretar os fenômenos naturais e sociais. Como a
criação científica é metódica, mesmo as descobertas ocasionais, raras nas
ciências jurídicas, têm antecedentes que se apóiam na metodologia científica,
pois o acaso só pode ser fecundo se o pesquisador estiver preparado para
explorá-lo cientificamente. Uma dessas obras que assinalaram intensamente o
estudo de uma ciência, mais designadamente das ciências jurídicas, é a sempre
citada Die Lehre den Proceβeinreden und die Proceβvoraussetzungen [08] de
autoria do jurista alemão Oskar Von Bülow, publicada inicialmente em 1868.
Tanto assim o é que essa obra é por muitos considerada a certidão de nascimento
da ciência processual [09], apropriado divisor de águas, portanto.
Em sua indigitada obra, Oskar Von
Bülow foi quem primeiro sistematizou a existência autônoma da relação jurídica
processual entre os atores do processo, relação essa absolutamente distinta e
autônoma da eventual existente relação de direito material – sempre
inicialmente alegada. [10]
Conquanto Bülow tenha sistematizado
e explicitado a existência autônoma do processo como ciência, não se pode
olvidar da importância creditada à anterior e celebre polemica travada na
Alemanha do século XIX, mais precisamente na década de 1850, entre Bernardo
Windscheid e Teodoro Muther, ambos juristas de renome. Da salutar polemica
entre os indigitados pensadores nasceu o atualmente aceito conceito de ação,
conceito esse que influenciou diretamente Oskar Von Bülow em sua obra. [11]
Destarte, assimilando e
impulsionando a superação da fase do sincretismo, temos a obra sobre a ação
meramente declaratória, do também doutrinador alemão Adolf Wach, que
ferrenhamente defendeu a teoria da ação como direito abstrato e as obras do
mais uma vez alemão James Goldschmidt, Der Prozeβ als Rechtslage [12] e
Zivilprozeβrecht [13], dentre outras.
No direito pátrio, a fase
sincrética apenas foi superada com a chegada de Enrico Tullio Liebmam, que em
nossas terras buscou distanciar-se das barbáries que assolavam a Europa e a
Itália fascista do início do século passado. Doutrinando nas Arcadas, Liebman
foi o responsável pela instituição da Escola Processual de São Paulo, na qual
definitivamente implantou a autonomia cientifica do processo na doutrina
pátria.
Surgiu então, nessa segunda fase, o
direito processual com autonomia científica, com princípios, conceitos,
institutos e método próprio. Deixou o processo de ser um mero modo de exercício
do direito violado, tutelando apenas a relação material. Aceitou-se a
existência independente de uma outra relação, a relação processual.
Essa fase é doutrinariamente
denominada fase autonomista, ou fase conceitual, uma vez que nela foram
conceituados os principais institutos científicos do direito processual.
Como ciência, o processo tem – na
relação jurídica processual, que não se confunde com a sempre necessariamente
alegada relação jurídica substancial – os seus sujeitos distintos, com a sempre
necessária e indispensável inclusão do juiz: A pessoa (física ou jurídica) que
alega um não cumprimento espontâneo da regra material e aciona o Estado é o
Autor.
O Estado, através do juiz (também
sujeito), atendendo o seu pedido, chama a juízo a outra parte, que
necessariamente tem o direito de se defender do alegado e, nessa relação é
chamado de Réu. Desse modo, se estabelece uma relação angular entre o Autor e o
Estado e entre esse e a outra parte, o Réu. São os sujeitos dessa distinta e
peculiar relação, a processual, que jamais se confunde com outra relação
jurídica, a material, nem sempre presente, mas sempre alegada (ou negada, em
caso de ação declaratória negativa, sempre fundada em dúvida objetiva).
Também difere a relação processual
por seu objeto, uma vez que se busca sempre um provimento jurisdicional,
consistente numa sentença que contenha, em seu bojo, uma tutela jurisdicional.
Por fim, difere também por seus pressupostos, distintos dos da relação
material.
Justamente a sistematização dos
conceitos correlacionados com essa autônoma relação jurídica processual
conduziu à aceitação da autonomia científica do direito processual, com a
definição de seu objeto material [14], que são: jurisdição, ação, defesa
(exceção) [15] e processo. Apenas nessa segunda fase metodológica entendeu-se
que o objeto do direito processual não é efetivamente os bens da vida – os
quais são objetos de estudo do direito material – mas sim os próprios fenômenos
que ocorrem na vida do processo, sempre e necessariamente diretamente ligado
aos institutos fundamentais acima delineados.
Nessa fase, extremamente
importante, o processo firmou-se como ciência e muito evoluiu o estudo dos seus
institutos.
Conquanto correto e absolutamente
indispensável esse reconhecimento da autonomia científica do direito
processual, nessa fase preocupou-se exageradamente com a conceituação e a
classificação cientifica metodológica dos institutos processuais (daí porque
alguns autores a denominarem de fase conceitual), muitas vezes apenas pela
então novel necessidade de afirmação cientifica, nem nenhum empenho ou
conveniência pragmática. Muitas vezes, era a classificação pela classificação,
a sistematização pela sistematização, visando apenas a reafirmação da autonomia
cientifica. Muita sede ao pote, portanto.
Travaram-se discussões doutrinarias
inócuas e absolutamente desprovidas de interesses pragmáticos.
Na ânsia de conceituar e classificar
tudo, conceituaram e classificaram tudo: não só os institutos fundamentais, que
clamavam e ansiavam por tanto, como também meros atos procedimentais de somenos
importância passaram a merecer aprofundado estudo e foram vítimas de tal
conceituação e classificação apragmática.
Subverteu-se a lógica: outrora tudo
era menosprezado como mero procedimento, meros atos estatais emanados do
próprio direito processual, sem nenhuma importância doutrinária e científica.
Agora, tudo é instituto fundamental e deve, portanto, ser estudado de forma
pormenorizada, tudo deve ser sistematizado, classificado e chaveado. [16] Meras
regras procedimentais, algumas até importantes – mas regras – foram
classificadas e estudadas com o status de verdadeiros princípios. [17]
Conquanto nessa fase a ciência
processual tenha obtido o reconhecimento de sua autonomia, pondo fim a fase do
sincretismo, esse exagerado apego a necessidade de se conceituar e sistematizar
todos os possíveis e imagináveis institutos e princípios levou a um exagerado
culto à forma em detrimento do objetivo maior do processo, afastando-se
exageradamente do direito material e de sua função pacificadora consistente em
sua função metajurídica. [18]
Nessa fase, o direito processual muito
se avançou como ciência, em grande parte justamente devido a necessidade de
afirmação de sua recém conquistada independência, valorizando-se demasiadamente
a técnica em detrimento do seus objetivos que, obviamente – uma vez que se
trata de ciência instrumental – lhe são externos. Esqueceu-se dos objetivos do
processo, passou-se a conceber, como já pregado, o instrumento pelo próprio
instrumento. [19] Os destinatários do método clamavam por mutações, o processo
não atendia eficazmente o seu escopo.
Instrumentalismo
Após longo tempo em sua fase
autonomista, na qual o processo finalmente conquistou sua autonomia cientifica,
abandonando definitivamente a fase sincrética, fase em que foram desenvolvidos
e sistematizados os principais institutos e conceitos da ciência processual, os
estudiosos dessa ciência perceberam-se da necessidade de se estudar o processo
em função de seus resultados, e não como um fim absoluto em si próprio.
Evoluiu, portanto, a ciência processual mais uma vez, conscientizando seus
estudiosos que a importância real do processo está em seus resultados.
Passou-se a buscar meios para a necessária efetividade do processo, qual seja,
um sistema processual apto para servir como verdadeira e eficiente via à
"ordem jurídica justa".
Caracteriza-se por ser uma fase
eminentemente crítica, assumindo que, conquanto a ciência processual já tenha
alçado inigualável desenvolvimento, esse desenvolvimento não foi seguido pelo
sistema processual que continua inapto ao seu primordial escopo. Reconhece que
o processo não tem como seus destinatários os operadores do direito, os
juristas, e sim, os jurisdicionados, que são os verdadeiros consumidores da
função jurisdicional.
Não basta um processo eminentemente
técnico e com primor cientifico, plenamente apto a agradar seus operadores e
estudiosos: roga-se por um processo eficaz e célere, apto à solucionar as
crises do direito material e benévolo aos que dele necessitam diuturnamente
como seus destinatários.
Pós-instrumentalismo
Hodiernamente, conclama-se à
revisitação do sistema processual construído na fase autonomista e aprimorado
na fase instrumentalista. Tomamos a liberdade de, modestamente e sem
pretensões, denominarmos a fase atual vivida pela ciência processual de fase
"pós-instrumentalista" tomando como premissa a afirmação de renomado
processualista, que reconhecemos como um dos idealizadores dessa nova fase,
conquanto expressa afirmação nesse sentido. [20]
Nessa nova fase, que hoje temos o
privilegio de vivenciar, busca-se a necessária e indispensável reaproximação
entre os planos do direito material e do direito processual, uma vez que já
pacificado o caráter instrumental desse, conclamando a revisitar os institutos
processuais sob a ótica do direito material.
Hodiernamente reconhece-se que
muitos dos problemas que dificultam a perfeita prestação da tutela
jurisdicional decorrem do excessivo distanciamento entre direito e processo e
que a solução desses problemas somente poderiam ser encontrada com a
relativização do binômio.
Em obra de fôlego e de qualidade
cientifica inquestionável, primordialmente pelos resultados pragmáticos e pela
contribuição para a efetividade do processo, o Notável Desembargador Paulista
José Roberto dos Santos Bedaque, centrado no tema da tutela jurisdicional,
resultado pretendido pelo processo, analisa de forma impar os principais
institutos processuais à luz do direito material. Na doutrina pátria, não é
exagero considera-la um divisor de águas, dando início a essa novel fase
metodológica do direito processual. Busca-se um processo efetivo, com amplo
acesso facilitado a todos os jurisdicionados, minimizando ao máximo possível a
litigiosidade contida, com o imprescindível e incondicional respeito a todas as
regras decorrentes do devido processo constitucional e, ao mesmo tempo, célere.
Processo justo e équo, portanto.
Contudo, em que pese não se duvidar
da imprescindibilidade de tal reaproximação [21], muito ao avesso, não se pode
olvidar a necessidade de se distinguir de forma clara e científica os dois
planos autônomos do direito (relativizar o binômio sim, não elimina-lo [22]),
visto que tal confusão é fonte de inúmeras distorções no sistema que, muita das
vezes, acabam impedindo que a prestação jurisdicional seja efetiva, quando não
impede a própria prestação jurisdicional, extinguindo de forma anômala – sem
julgar o mérito – o processo já devidamente instruído e aparelhado para
fornecer sentença de mérito, essa sim pacificadora. Aproximar sim, emaranhar
não.
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